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Colunista:

De olho no C.N.C., por Arthur Stern
21/05/2014 - 16h43min

De olho no CNC – Não “jogou” melhor e ganhou

A coluna “De olho no CNC” retorna um pouco diferente, fazendo uma aparição absolutamente fora das características para a qual foi criada devido à excepcionalidade do fato. Na primeira coluna que publicamos, em 23 de Fevereiro de 2011, aonde fizemos uma apresentação dos propósitos da mesma, afirmamos que “a coluna “De olho no C.N.C.” pretende abordar os mais diversos assuntos (especialmente os mais polêmicos) sem colocar opiniões pessoais ou exemplos mas restringindo–se a analisar e interpretar o Código Nacional de Corridas e seu apêndice.” No entanto, diante da confirmação do segundo páreo corrido no hipódromo da Gávea no último sábado, optamos por fazermos uma coluna analisando sim o caso específico ocorrido e fazendo um juízo de valor já que o caso não dá margem a interpretações e poderia inclusive ser utilizado como exemplo em cursos e palestras para jóqueis e futuros comissários de corrida. Além disso, alguma polêmica se criou em torno do tema no espaço do leitor do site, aonde especulações sobre comissários que teriam votado a favor da desclassificação e justificativas para a confirmação do páreo começaram a surgir.

Infelizmente a comissão de corridas do Jockey Club Brasileiro, diferentemente da grande maioria dos hipódromos do mundo, não emite um relatório oficial após cada reunião registrando todos os detalhes observados na mesma, especialmente as decisões sobre as reclamações e os argumentos de cada um dos envolvidos. Por isso, nunca saberemos o que realmente aconteceu no recinto de julgamento da Comissão de Corridas e qualquer especulação sobre o que aconteceu não deve ser levada em conta.

Em nossa segunda coluna, intitulada “Desclassificação por delitos de raia”, publicada em 02 de Março de 2011, analisamos como o Código Nacional de Corridas disciplina o assunto. Para não voltarmos em detalhes ao mesmo, até porque o assunto mereceu uma coluna inteira justamente pela sua importância e complexidade, resumidamente podemos dizer que para uma desclassificação ocorrer, basicamente temos que ter duas condicionantes atendidas, a existência de um prejuízo causado por um animal a outro, o que na maioria dos casos não é difícil de ser definido e a avaliação de que o prejuízo ocorrido teve como consequência uma alteração no resultado do páreo (e ainda bem que nosso código possui esta condicionante, não sendo “burro” como alguns códigos ainda são). Esta última avaliação é mais complexa de ser feita, mas para isso estão lá comissários de corridas que deveriam ser pessoas conhecedoras tanto de corridas de cavalos como de cavalos de corrida, duas áreas de conhecimento distintos. Além disso, a Federação Internacional das Autoridades Hípicas (FIAH) recomenda que as comissões de corridas do mundo padronizem os conceitos e a interpretação de seus respectivos códigos para definir o que a FIAH chama de "regras de interferência na pista", justamente para que a tal subjetividade da alteração no resultado do páreo fique mais clara a todos os participantes do “jogo” (jóqueis, treinadores, proprietários, criadores e apostadores). Para a definição destas padronizações, poderiam ser utilizados por exemplo, os conceitos de “Manutenção do equilíbrio” e “Garantia de espaço” já brilhantemente explorados por Sergio Barcellos em seu livro Cavalos de Corrida – Uma Alegria Eterna.

O caso específico a ser analisado envolveu os animais Outplay, montado por Dalto Duarte e Captain Hook, montado por Valdinei Gil, que resultou na confirmação do resultado na pista, aonde pode se observar uma vitória por diferença mínima de Outplay, e a suspensão do jóquei Dalto Duarte, baseada no artigo 140, por duas reuniões “por prejudicar competidor Captain Hook nos 50 metros finais” (as aspas foram colocadas pela exatidão na repetição do texto publicado na resolução da comissão de corridas através do Boletim Oficial Nº 109). As decisões da Comissão de Corridas, por si só, são controversas já que ela reconhece um prejuízo suficiente para punir o piloto em duas reuniões, portanto o dobro da pena mínima para a infração do artigo 140, nos 50 metros finais do páreo em questão, vencido por diferença mínima como pode ser observada na foto abaixo, mas entendeu que o tal prejuízo, não foi suficiente para “atrasar” o animal prejudicado em aproximadamente 10 cm (diferença aproximada entre o vencedor em pista e o derrotado). 

Voltando as condicionantes estabelecidas pelo CNC para a desclassificação de um animal por delito de raia, concluímos facilmente que o prejuízo foi reconhecido pela comissão de corridas e que o que não foi reconhecido pelos comissários de corrida foi a alteração do resultado do páreo já que houve a confirmação do resultado de pista. Apenas como exercício, os animais percorreram os 1300 metros do páreo em 77 segundos e 57 centésimos de segundo. Desta forma, podemos dizer que os 10 cm (1/13000 do páreo) de diferença encontrados na linha de chegada representam aproximadamente 0,0059 segundos, ou seja, aproximadamente 6 milésimos de segundo. Em face disto, para que se tenha uma idéia, sem entrar a fundo na manutenção do equilíbrio mas apenas superficialmente informando que a mesma prega que “animais que são deslocados de seu eixo em virtude de esbarros ou encontrões de algum concorrente (“bumps”, no Código inglês) – e com isso perdem o equilíbrio – merecem o favor da análise dos comissários a respeito” podemos facilmente imaginar que, os comissários de corrida entenderam que a trombada dada por Outplay em Captain Hook não foi suficiente para “atrasar” este último em aproximadamente 6 milésimos de segundo. 

Diante do exposto nos parágrafos anteriores creio que tenha ficado absolutamente claro, que tomadas apenas as decisões tomadas pela comissão de corridas e o que diz o CNC podemos afirmar que as decisões tomadas são contraditórias mesmo a um leigo que estudasse o assunto.

Independente da contradição comprovada acima, vamos a uma análise rápida em relação ao páreo em si, sem levar em consideração as decisões da comissão de corridas. O animal Outplay aparece com ação avassaladora nos últimos 150 metros do páreo, bastante aberto, dando a impressão de que iria vencer o páreo até mesmo com certa firmeza. No entanto, um pouco mais adiante, talvez faltando aproximadamente 80 metros para a linha de chegada, ao apanhar de direita, o animal começa a diminuir sua velocidade e atirar–se violentamente para dentro, talvez pelas “manhas” comuns aos estreantes, talvez por certo cansaço ou mesmo dos dois fatores somados, vindo da linha 10 para a linha 4 mais ou menos aonde choca–se violentamente com o animal Captain Hook que claramente chega a se desequilibrar obrigando o jóquei Valdinei Gil até mesmo a alinhar novamente a cabeça do animal que vê o pescoço inteiro que tinha de vantagem a menos de 50 metros para o disco sumir com a trombada e logo depois os dois animais cruzam a linha de chegada praticamente emparelhados. Apenas com comentário adicional, já que a trombada dada por Outplay logicamente alterou o resultado do páreo visto a diferença observada na linha de chegada e o prejuízo em si, na reta frontal, fica claro inclusive que o animal não consegue se reequilibrar até o término do páreo.

Adicionalmente, é interessante observar que o animal se atira para dentro e não é guiado nesta direção pelo seu jóquei apesar do mesmo estar exigindo o animal da direita o que faz com que o animal tenda a ir para dentro. No entanto, em minha opinião, o movimento do animal foi rápido e dificultou uma correção por parte do jóquei o que isenta o mesmo do dolo, mas não da desclassificação como claramente o artigo 159 do CNC define. Desta forma, a punição imposta ao jóquei Dalto Duarte, não foi correta.

De uma maneira resumida, o julgamento correto do páreo seria a desclassificação do animal Outplay para segundo lugar e a absolvição do jóquei Dalto Duarte de qualquer punição.

Outplay é uma expressão que denota quando alguém ou um time, joga melhor do que seu oponente. Esta expressão independe do resultado final ou mesmo oficial do quer que se esteja jogando. No caso do belo equino declarado ganhador do segundo páreo de sábado, a demonstração dada na estreia indica que tem tudo para seguir uma campanha bastante vitoriosa, sempre “jogando” melhor do que seus oponentes e ganhando suas competições merecidamente mas no último sábado (e talvez isto nunca mais se repita visto que o filho de First American estava estreiando), não tenho dúvida de que “Captain Hook outplayed Outplay” e com um julgamento correto, o animal vencedor seria Captain Hook. 

Arthur Stern


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