Colunista:
REPRODUTOR X MATRIZ 24/03/2014 - 12h55min
I – INTRODUÇÃO
Uma das mais antigas polêmicas que levou a muitas discussões, com partidários defendendo o Reprodutor como o mais importante na transmissão de suas características genéticas para o Produto Projetado, em sua maioria mais expressiva, mas também com partidários defendendo a Matriz como a de maior influência para o Produto Projetado, tendência que vem se acentuando expressivamente, sobretudo a partir do século 21.
Já tive oportunidade de abordar este polêmico assunto em alguns de meus artigos, mas sempre num plano secundário, ou seja, sem dirigir o foco do artigo para externar minha posição sobre esta polêmica, mas com uma tendendo para conceder uma ligeira vantagem para a influência da Matriz.
Com o decorrer e evolução de minha Pesquisa sobre o Puro Sangue Inglês (PSI), no transcurso destes 44 anos, como não poderia deixar de ser, fui assumindo novas tendências até chegar à minha conclusão definitiva sobre esta polêmica.
Em última análise, esta polêmica não deveria existir, pois ambos são fundamentais, mas o que realmente importa é o ENCAIXE GENÉTICO e FÍSICO, entre os Genótipos, refletidos em seus respectivos Pedigrees, e os Fenótipos, refletidos em seus respectivos Físicos.
II – ENCAIXE GENÉTICO
O que se deve entender por “encaixe genético” resume–se na Complementação Mútuas das características genéticas da Matriz com as características genéticas do Reprodutor, ou seja, os Traços Hereditários transmitidos pela Matriz devem ser adequadamente complementados pelos Traços Hereditários transmitidos pelo Reprodutor, resultando no Genótipo do Produto Projetado que, pelo menos teoricamente, deveria reunir as características genéticas positivas mais expressivas da Matriz e do Reprodutor, resultando no Genótipo de qualidade do Produto Projetado, que venha a ser refletido positivamente em sua Campanha nas pistas.
Como a Genética não é uma Ciência exata, além de ser imprevisível, os resultados positivos nem sempre são obtidos, ao contrário, são bem mais complicados para serem conseguidos, razão pela qual os animais de exceção nas pistas de corrida são muito mais raros de serem observados, o que torna fascinante a Pesquisa, Estudo e Análise (Planejamento Genético) exigidos para uma proveitosa Criação do PSI.
Por outro lado, a Genética é tendenciosa e, desta forma, os Estudos e Análises realizados através de um Planejamento Genético criteriosamente elaborado para se encontrar o Reprodutor mais adequado para a Matriz em foco, deverão proporcionar expressivo aumento da probabilidade para obter um Produto Projetado de alto padrão de qualidade.
Esta é a razão primordial para que certos Criadores importantes sigam a metodologia de praticar até três vezes, não necessariamente consecutivos, o cruzamento resultante de um Planejamento Genético considerado como criteriosamente elaborado.
Por igual razão, muitas vezes um Reprodutor consagrado, respaldado por excelente Campanha nas pistas, servindo uma Matriz também com Campanha de nível clássico, resultará num Produto de qualidade inferior à legítima expectativa, porque independentemente do nível de suas respectivas Campanhas nas pistas, se o “encaixe genético” não se consumar de forma adequada e desejada, o Produto resultante dificilmente cumprirá uma Campanha, no mínimo aceitável, nas pistas.
Usualmente, para se eleger um “racehorse” como Reprodutor, é de fundamental importância levar em consideração sua Campanha nas pistas, observando–se o padrão de alto nível de suas performances na esfera Clássica e de Grupo e, sobretudo, a sua Consistência Físico–Orgânica (Vigor Híbrido) que deverá proporcionar, por ocasião de sua retirada das pistas, que se apresente sem Lesões importantes, refletindo um Fenótipo pautado pelo Equilíbrio de seus Conjuntos Físicos e Aprumos corretos.
No que se refere à Matriz, sua Campanha nas pistas já não tem tanta importância, no que se refere aos resultados obtidos nas pistas, para seu aproveitamento na Reprodução, pois o que efetivamente importa para esse aproveitamento é a excelência de sua Configuração Genética (Genótipo), propício a um adequado “encaixe genético”.
Na realidade, sobretudo na Criação do PSI das últimas décadas, a maioria das “racemares” que se destacaram como Matrizes cumpriram Campanhas adequadamente planejadas, não sendo excessivamente exigidas em seu Treinamento e, consequentemente, não sendo exigidas acima dos limites de sua Capacidade Natural.
Muitas das Fêmeas que se revelaram excelentes Matrizes, sequer chegaram a correr!
Como já tive oportunidade de citar várias vezes, o excepcional Criador, a nível internacional, Federico Tesio, citava constantemente que: “Há Fêmeas para as Pistas e Fêmeas para os Haras”, evidenciando que são raras as Fêmeas que exercem as duas Funções em alto nível.
Evidentemente, em meu julgamento, todas as Fêmeas que apresentem Genótipos e Fenótipos, pelo menos aceitáveis, deverão ser testadas como Matrizes, pois ressalto que o que realmente importa é o “encaixe genético” e “encaixe físico” que irá proporcionar com o Reprodutor selecionado.
Estas peculiaridades genéticas possibilitam a oportunidade para que Reprodutores com menor apelo comercial, em sua grande maioria que não tiveram chance de servir Matrizes adequadas ao seu Genótipo, ou que serviram um número reduzido de Matrizes, venham a produzir, ainda que esporadicamente, Elementos que se destaquem nas pistas de corrida quando encontram uma Matriz cujo Genótipo proporcione o adequado “encaixe genético e físico” acima citado.
Estes Reprodutores são praticamente excluídos da Criação do PSI logo no início de sua atividade reprodutiva, sem que tenham a devida oportunidade na Criação do PSI no Brasil, apesar de terem produzidos excelentes Campanhas nas pistas.
Gorylla: Vencedor do GP Carlos Pellegrini – Não aproveitado como Reprodutor!
Idêntica situação ocorre com Reprodutores que não sejam descendentes por seu Alinhamento Masculino Paterno (“Sire Line”) das “Bloodlines” mais badaladas, atualmente, as de NORTHERN DANCER e Mr. PROSPECTOR, o que já está contribuindo para severa redução do Vigor Híbrido original do PSI.
Alguns “racehorses” que não se saíram a contento como Reprodutores, quando no exercício da função como Avô Materno, contribuíram para a produção de excelentes Produtos nas pistas, pois suas Filhas, como Matrizes vieram a proporcionar o adequado “encaixe genético e físico” com os Reprodutores selecionados para elas por um Planejamento Genético criteriosamente elaborado.
DE QUEST é um exemplo notório desta situação na Criação nacional do PSI!
Decepcionante Reprodutor – Excelente Avô Materno
A Criação brasileira do PSI, desde a década de 80, sobretudo no que se refere ao uso de Reprodutores sediados em definitivo no Brasil, concentrou em demasia em “Bloodlines” pontuadas por Mr. PROSPECTOR e NORTHERN DANCER, promovendo uma evidente “saturação sanguínea” (Consanguinidade) para o PSI nacional, com consequências negativas para boa parte de nosso “Bloodstock”, envolvendo certo nível de Fragilidade Físico–Orgânica em nosso PSI, que ficou mais vulnerável a Lesões de ordem física e orgânica (hemorragias) o que veio a repercutir em Campanhas mais curtas.
Hoje em dia no Brasil, em seus dois principais Hipódromos, já não é muito fácil formar páreos para os quatro anos, sobretudo em distâncias mais longas, e quando formam são páreos vazios, quase sempre misturando enturmações em sequência, e / ou apelando para a mistura com animais de mais idade.
O caminho a ser seguido, sobretudo pelo Criador em que o apelo comercial não é o objetivo primordial, pois usualmente cria para correr seus próprios Produtos, é a importação de Reprodutores descendentes de Linhagens / “Bloodlines” abertas, muitas das quais em rota de extinção, pontuadas por HYPERION / TUDOR MINSTREL; TOURBILLON / AHONOORA ; BLANDFORD / MAHMOUD; DARK RONALD / ACATENANGO; St. SIMON / RIBOT; MAN O’ WAR / IN REALITY; HIMYAR / DOMINO e ROUGH’ N TUMBLE , assim como, trazer mais descendentes de NASRULLAH, ROYAL CHARGER, BUCKPASSER, SADLER’S WELLS e DANEHILL, todos com forte influência da fenomenal Matriz MUMTAZ MAHAL.
Uma prova cabal desta tendência pode ser vista na excelência da Produção de PUT IT BACK (MAN O’ WAR / IN REALITY), sem dúvida o Reprodutor de maior destaque do momento no Brasil, na ótima produção de DUBAI DUST (HIMYAR / DOMINO) e do promissor AGNES GOLD (PHALARIS / ROYAL CHARGER), entre os Reprodutores que se encontram sediados no Brasil.
Put It Back: Reprodutor de maior evidência na Criação nacional do momento
Dubai Dust: Reprodutor que mais evoluiu em sua Produção
Agnes Gold: Reprodutor com grande potencial com suas primeiras Gerações
Por terem seus respectivos “abertos”, estes Reprodutores de sucesso, também reúnem as condições favoráveis para que venham a se apresentar, em futuro próximo, como muito bons Avôs Maternos, através de suas Filhas, quando passarem a exercer a fundamental função de Matriz.
Também aguardamos com grande e fundada expectativa a produção de Reprodutores que vieram sob o sistema de “shuttle” como MACHO UNO (HIMYAR / ROUGH’ N TUMBLE), SHIROCCO e MANDURO (BLANDFORD / BAHRAM), que se apresentam como Reprodutores abertos a Matrizes de praticamente todas as demais Linhagens / “Bloodlines”, cujos Produtos iniciarão suas Campanhas em 2014.
Macho Uno
Shirocco
Os primeiros Produtos de MANDURO iniciarão Campanha em 2015
Estes Reprodutores, por terem um Pedigree “aberto”, independentemente do desempenho que seus Filhos e Filhas venham a apresentar nas pistas, certamente terão papel de relevo como Avôs Maternos, através das Filhas, como futuras Matrizes, que deixarão para a Criação brasileira do PSI.
III – ENCAIXE FÍSICO
Tão importante quanto o “encaixe genético”, é o “encaixe físico” proporcionado pelo Fenótipo da Matriz e do Reprodutor selecionado.
Assim como o Genótipo revela através do Pedigree aquilo que não se vê, o Fenótipo revela o que pode ser visto, ou seja, o Perfil Físico do PSI que é composto por seus Conjuntos Físicos, dentre os quais o Conjunto Cabeça / Pescoço é um dos mais importantes para o desempenho do PSI nas pistas de corrida.
Assim como no “encaixe genético”, o adequado encaixe entre os Conjuntos Físicos da Matriz e do Reprodutor, complementando–se mutuamente, deve procurar o seu Equilíbrio do Perfil Físico do Produto Projetado pelo cruzamento assinalado no Planejamento Genético criteriosamente elaborado.
Partindo–se do Fenótipo da Matriz, admitindo–se inclusive que possam apresentar pequenos deslizes em seus Aprumos, é possível proporcionar a correção necessária através dos Aprumos do Reprodutor, procurando o encaixe que proporcione a complementação Física essencial a um adequado cruzamento.
Em última análise, sobretudo no que se refere ao Fenótipo, o que é de fundamental importância é o EQUILÍBRIO entre seus Conjuntos Físicos (Cabeça /Pescoço / Paleta / Ancas, entre outros) e dos Aprumos e Angulações de seus Membros (Anteriores – aparadores e Posteriores – empurradores).
Os aspectos básicos do Fenótipo, ou seja, o PORTE, TIPO e PESO, por si só não são tão decisivos para o desempenho do PSI nas pistas, desde que guardem um bom padrão de Harmonia e Equilíbrio entre si.
De qualquer forma, estes aspectos básicos guardam certa correlação com o Alcance Estamínico (distância ou faixa de distância nas quais cumpriram suas melhores performances em sua Campanha nas pistas).
De uma forma geral, esta correlação se comporta da seguinte maneira:
“Sprinter” – 1000 m a 1200 m – São animais de grande Massa Muscular, apresentando, em geral, Porte Avantajado, Tipo Compacto e Peso Elevado, compatível com seu Porte e Tipo, podendo ocorrer certa vantagem de volume das Ancas sobre a Paleta.
“Flyer” / “Miler” – 1300 m a 1700 m – Porte Médio, Tipo Médio e Peso não muito elevado, compatível com seu Porte e Tipo;
Meio–Fundista – 1800 m a 2200 m – Porte Médio, Tipo Médio para Longilíneo, Peso compatível com seu Porte e Tipo;
Fundista – 2400 m a 2700 m – Porte Médio para Pequeno, Tipo Longilíneo, Peso compatível com seu Porte e Tipo.
“Stayers” – 2800 m para mais – Similar ao Fundista, mas exibindo um Fenótipo praticamente perfeito quanto à Harmonia de seus Conjuntos Físicos, além de Aprumos tendendo para a perfeição.
Evidentemente são Conceitos Gerais, pois o que importa, em última análise, é o EQUILÍBRIO de seus Conjuntos Físicos e Aprumos Corretos.
Deve–se levar em consideração, entretanto, que o PSI de grande Porte, do Tipo compacto e Peso excessivamente elevado, não primam pelo Equilíbrio Físico, sendo mais vulneráveis a Lesões de ordem física e, consequentemente, cumprindo Campanhas mais curtas, alguns dos quais sequer chegam a correr.
IV – CONCLUSÃO
O Artigo aborda uma antiga questão para saber qual é o mais importante para o Produto Projetado no Planejamento Genético, o Reprodutor ou a Matriz, e não tenho dúvida que os doía são importantes, acima de tudo, porque um depende do outro para gerar um Produto, como regra natural da vida para a perpetuação da raça.
O que pode ser discutido é a questão de qual dos dois, Reprodutor ou Matriz, é mais influente nos Traços Hereditários que irão caracterizar o Produto Projetado.
Em primeiro lugar, devo ressaltar que na Criação do PSI, sob o ponto de vista estritamente genético, só por coincidência haverá uma partição absolutamente igualitária na influência transmitida pelo Reprodutor e pela Matriz, pois usualmente se constata o predomínio de um sobre o outro com diversos graus de intensidade e frequência.
O que deve ser considerado é que a transmissão genética proporcionada pela Matriz, pontuada por sua Família Materna, delineada pela sequência das Mães, refletida na “bottom line” (linha baixa) do Pedigree, é muito mais Consistente e Duradoura do que a transmissão genética promovida pelo Reprodutor, delineada pela sequência dos Pais, refletida na “high line” (linha alta) do Pedigree de um PSI.
A comprovação desta observação ficou bem nítida ao presenciar a expressiva extinção de Linhagens pontuadas por excepcionais Reprodutores nascidos ao final do século 19 (apenas dois) e durante o século 20 (vinte Reprodutores), portanto, 22 Linhagens de Referência que identifiquei ao final da década de 80.
Após apenas 25 anos, das 22 Linhagens Masculinas Paternas pontuadas por Reprodutores que contribuíram decisivamente para a evolução do PSI no transcurso do século 20 e início do século 21, verifiquei com grande surpresa que apenas 8 delas permanecem ativas, algumas das quais caminhando a passos largos para a extinção.
Já pelo lado das Famílias Maternas, desde a década de 50, por ocasião das Ramificações realizadas pelo Capitão Bobinski, as cerca das 30 Famílias Maternas ramificadas permanecem ativas, ainda que com amplo destaque para as dezesseis primeiras Famílias, no que se reporta ao desempenho de seus Descendentes nas pistas.
Se atentarmos para o fato de que os Reprodutores de maior destaque chegam a produzir mais de 60 Produtos por Temporada de Monta, enquanto cada Matriz gera apenas um Produto por Temporada, e levando–se em conta que nem todos são Fêmeas, fica fácil constatar a maior consistência na transmissão dos Traços Hereditários da Matriz, se comparada com a transmissão proporcionada pelo Reprodutor.
Além disso, a Genética Molecular nos indica que a Matriz tem uma participação mais intensa na formação Mitocondrial, em última análise, responsável maior para a qualidade do Produto Projetado.
Sob o ponto de vista Biológico, durante o fundamental período de 5 a 6 meses após o Parto, o Produto depende integralmente dos cuidados dispensados pela Mãe, quer pela qualidade de seus Instintos Maternais, quer pela quantidade e qualidade de seu Aleitamento, proporcionando a base essencial para o futuro desenvolvimento do Produto após o Desmame.
Assim sendo, no cômputo geral, sem menosprezar de forma alguma a importância do Reprodutor na qualidade do Produto Projetado, a participação da Matriz leva alguma vantagem na influência sobre o Produto, ainda que esta posição não deva ser considerada em seus termos absolutos pois, com alguma frequência, pode–se observar que o Reprodutor também tem seus momentos de predomínio.
Para concluir, ressalto que o que realmente importa é o adequado “ENCAIXE GENÉTICO e FÍSICO” obtido através da Complementação mútua das Características Genéticas da Matriz e do Reprodutor.
Autor: Orlando Lima
e.mail: omlimapsi@gmail.com
blog: www.goldblendconsultoria.blogspot.com
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