Colunista:
Foi dada a largada, por Jéssica Dannemann 20/12/2010 - 13h17min
“Sonho de uma noite de verão”
Na obra de Shakespeare o cenário era a Grécia, na nossa história, as não menos míticas Vilas Hípicas. Se trocarmos a sinopse dos personagens, talvez pudéssemos descrever essa nova versão de horror magia e realidade com a mesma dimensão do grande dramaturgo.
Egeu, impopular presidente de um clube hípico aflito em busca da glória, procura a ajuda de Teseu, grande herói das águas das piscinas para forçar Hérmia, uma cocheira de 84 anos de idade, a casar–se com Demétrio, um conhecido empreiteiro do nordeste do Brasil. Decidida por viver ao lado de Lisandro, um perseguido puro–sangue–inglês, Hérmia, ameaçada de morte por Egeu, busca refugio junto aos homens de bem no bosque do Jardim Botânico.
Na obra daqueles seres élficos com personagens mitológicos, a Lei não dava direito a que as pessoas decidissem sobre o futuro, punindo com a pena de morte qualquer desobediência. Aqui, embora a pena de morte já tivesse sido decretada, mesmo que em desobediência à própria “Lei” do turfe, as pessoas de bom senso conseguiram evitar que alguém viesse a transformar o nosso clube, num monstro com cabeça de asno, apelidado indecentemente de Boulevard.
A única coisa que difere a ficção da realidade, é que apesar da coincidência pelas múltiplas confusões provocadas nas duas fábulas, eu creio que não haverá por aqui nenhum interessado em se divertir do desfecho.
Essa passagem será guardada de forma triste, como sendo uma das páginas mais negras da história do Jockey Club Brasileiro, conhecida que será doravante, como sendo o dia em que um grupo pequeno de visionários, disfarçado de heróis, tentara em vão se apoderar do futuro das corridas de cavalo.
Porém, nem só de final triste vive o desastre. Nesses quase três anos, os grupos de cocheiras com a transferência proibida, impedidos de serem modernizados, provocaram um substancial prejuízo ao patrimônio do clube e um imenso retrocesso na atividade hípica.
Muitas coudelarias foram inibidas de debutar, como outras fardas tiveram que ser engavetadas por conta dos tratores que rumavam em comboio na direção da nossa história, tal como aqueles anfíbios da Marinha que vimos recentemente. Uns em busca da paz, e outros para provocar a discórdia.
O clube inteiro foi transformado numa imensa campanha publicitária, onde o foco, no seu dia–a–dia – de um outrora promotor das mais emocionantes corridas de cavalo – passou a ser o de uma sociedade empreendedora de projetos imobiliários; do respeitado esporte dos reis ao desprezível doente terminal, apenas um passe de mágica.
O JCB passou a ser divulgado na mídia através de relatos grotescos entoados pelo seu próprio “presidente”, que não poupou palavras para espalhar o terror pelas páginas das revistas e dos jornais, deflagrando uma crise institucional sem nenhum precedente na história do clube, afirmando que a instituição estava morrendo.
Mesmo que o desastre de demolir as Vilas Hípicas não tenha passado de um outro "sonho de uma noite de verão", seria importante, daqui pra frente, que os sócios do JCB, um pouco mais instruídos da importância desse segmento para o futuro da sociedade, utilizassem corretamente, na visão do clube, o sumo da flor do amor perfeito.
Mas eu creio, assim como aconteceu com a obra de Willian Shakespeare, que demorou séculos para encontrar o seu merecido reconhecimento, que somente daqui a muitos anos, as pessoas vão render conta do perigo que o JCB correu nas mãos dessa gente que tentou de todas as formas colocar escritórios comerciais no lugar das cocheiras do hipódromo.
Cômico se não fosse trágico.
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