Colunista:
O CAVALO FINO TRATO E EU 21/01/2009 - 10h39min
PARTE II
Por tudo o que aconteceu, desde a sua concepção, até a sua campanha nas pistas, FINO TRATO era como um filho para mim, e quando entrava na pista para uma corrida, minha principal preocupação, era que terminasse inteiro, sem lesões ou problemas! O resultado da corrida ficava num segundo plano!
Aos sábados, pela manhã, por ocasião de minhas visitas de rotina, eu e o FINO TRATO brincávamos de tal forma, que ele mais parecia um cachorrinho, do que um cavalo de corrida pois, assim que me via, começava a balançar sua cauda, tal qual um cachorro, ao receber os agrados de seu dono.
Entre as brincadeiras de que mais gostava, uma em especial chamava a atenção das crianças das redondezas que, assim que eu chegava, iam para a cocheira do Capitão, presenciar as brincadeiras entre o FINO TRATO e eu.
FINO TRATO adorava que eu pegasse um talo de alfafa e dava para ele ir engolindo, como se fosse um “spaghetti”, deixando a ponta de fora para eu puxar, até que trincava os dentes, e repetia a “operação” por diversas vezes, até que ele resolvia comer o talo.
Numa dessas manhãs, quando brincava com ele, o Capitão me chamou e eu me distraí para conversar com ele, quando senti uma intensa dor na parte interna do meu braço. Quando olhei para o braço, estava estampada a arcada dentária dele, e eu fiquei uma “fera”, gritando com ele com muita veemência, mostrando para ele a marca de seus dentes no meu braço. Ele se encontrava na porta do boxe, baixou a cabeça e foi para o fundo do boxe, sem olhar para mim.
O Capitão, do alto de sua experiência, assinalou que ele não tinha feito por maldade pois, se assim fosse, teria arrancado um pedaço do meu braço. Na realidade, estava brincando comigo! Eu fiquei emocionado com a reação dele e, ao mesmo tempo, arrependido de ter gritado com ele e, por mais que eu o chamasse (eu o chamava de PRETO), ele, sequer, olhava para mim e, então, com a desaprovação do Capitão, que achava perigoso, resolvi entrar no boxe, pois eu tinha receio que aquela situação pudesse abalar a nossa amizade.
Entrei bem devagar, chamando pelo seu apelido, bem baixinho, mas ele não olhava para mim, até que cheguei ao seu lado, passei a mão pelo seu pescoço, dei um abraço em seu pescoço e ele, prontamente, começou a balançar a cauda, e eu dei um beijo na bochecha dele, e ele veio comigo de volta para a porta do boxe, reiniciando as brincadeiras.
Nessa altura, havia bastante gente na proximidade do boxe, e todos nós ficamos muito emocionados com aquela cena, e o Capitão disse que jamais, nos longos anos de sua vida como Treinador, tinha presenciado uma cena como aquela!
Dos 23 segundos lugares que obteve na Gávea, 9 foram revelados pelo “photochart”, disputando o 1º lugar, ou seja, como as suas vitórias foram nítidas, ele perdeu todas as fotos das quais participou, disputando as vitórias. Sua vocação para tirar 2º lugar, lhe valeu o apelido de “Caixa Econômica – Agência Gávea”!
Num belo dia, na hora do almoço, no Centro da Cidade, passando pela rua Senador Dantas, minha filha que, recentemente, venceu o 4º Desafio do concurso Seven Stars, da Godolphin, e que tinha ido almoçar comigo para comprar livros escolares, me chamou a atenção para uns folhetos de propaganda espalhados pelo chão. Havia muitos deles! Peguei um e vi que se tratava de propaganda de uma Pensão, cujo nome era FINO TRATO. Guardei um folheto, e levei para o Jockey, para mostrar aquela coincidência para meus amigos, quando um deles falou: “Você não sabe que tem um apostador que só joga o placê do FINO TRATO e já ganhou tanto que colocou o nome da Pensão em homenagem a ele?” Eu não sabia!
Em 1978, com a morte do XENGO, meu melhor cavalo nas pistas, resolvi vender todos os meus cavalos, e o primeiro a ser vendido foi o FINO TRATO, por sorte, para o Haras Lawn Tennis, de um casal amigo, cujo Treinador era o Capitão, o que me permitiu acompanhar, de perto, sua campanha nas pistas e continuar com as brincadeiras na cocheira, a mesma em que se encontrava, quando de minha propriedade.
Ele ficou exatos 365 dias com o Lawn Tennis, período no qual tirou vários 2ºs lugares e colocações, mas não venceu uma corrida sequer!
A Ruth e o Herbert, proprietários do Lawn Tennis, me convenceram de recomprar o FINO TRATO e, na primeira corrida com a minha farda, ele venceu! Parece que ele sabia que eu iria comprá–lo de volta, e reservou a vitória para essa ocasião! FINO TRATO, também, era conhecido como o “Cavalo de Aço” e para comprovar este apelido popular, numa dessas situações imprevisíveis, estava inscrito em duas Provas, na mesma semana, a primeira, numa noturna de 2ª feira, e a outra, na 5ª feira seguinte.
Correu a Prova da 2ª feira, alcançando mais um 2º lugar! Eu estava pronto para fazer o seu “forfait”, mas a sua notável recuperação, após uma corrida, levou o Capitão a concluir que ele poderia correr a corrida de 5ª feira, sem maiores problemas!
Nessa 5ª feira desabou um sonoro temporal, que deixou a pista esburacada e perigosa para a realização das corridas, aponto de que, nas três primeiras corridas, foram sacrificados três animais, por conta de acidentes na pista.
Eu e outros Proprietários, tentamos cancelar os páreos restantes, mas não tivemos respaldo da Comissão de Corridas, que resolveu dar continuidade às corridas.
FINO TRATO correu o 6º ou 7º páreo, numa pista totalmente esburacada e, VENCEU!
Durante a foto, não parecia ter acabado de correr! Realmente incrível!
Sem dúvida, o nome ajudou muito para a sua popularidade e, em 1981, para comprovar essa popularidade, quando mudei para um apartamento que havia comprado, meus vizinhos de porta,os atores Carlos Eduardo Dolabela e Pepita Rodrigues, na primeira visita que fizemos a eles, Pepita soube que eu tinha cavalos no Jockey e me pediu para levá–la ao Jockey, pois tinha uma grande curiosidade para conhecer um certo cavalo, de nome muito engraçado! Antes dela dizer o nome, como que adivinhando, eu disse: “Já sei! Você quer conhecer o FINO TRATO, certo? Ela retrucou:” Como você adivinhou?” e eu expliquei: “Ele é meu!”.
No dia 21 de agosto de 1982, estava inscrito, com J. Ricardo, vindo de uma vitória, também, com o Ricardinho, e eu estava de luto, pois minha filha, Carolina, de 6 anos de idade, e que gostava do PRETO, apelido que ela própria dera, havia falecido no sábado anterior, e a Missa de 7º Dia, realizada no Colégio Teresiano, onde as minhas duas filhas estudavam, foi realizada naquela tarde de sábado e, assim que terminou, saí com meu irmão, e fomos para o Jockey, para assistir à sua derradeira vitória (8ª) nas pistas de corrida, como se estivesse prestando sua homenagem à Carolina, que gostava muito do PRETO!
O que me chamou a atenção, foi que, de tantas e tantas vitórias que tive oportunidade de tirar as fotos, após as vitórias de meus cavalos, no Hipódromo da Gávea, foi a única em que aparece a imagem do Cristo Redentor ao fundo.
Aos 8 anos, logo após a sua centésima apresentação nas pistas de corrida, no Tarumã, dei o FINO TRATO para o Haras Lawn Tennis, para servir, como Reprodutor.
Eu estava no Haras quando ele chegou de viagem, vindo do Paraná, e constatei que estava com um intenso processo de intoxicação. Expliquei que deveriam tratá–lo durante uns 2 meses, para que ele pudesse iniciar sua função como Reprodutor, mas sem que esse período fosse cumprido, ocorreu um acidente durante o primeiro serviço de monta e, traumatizado, não conseguiu cobrir, novamente, naquele Haras.
Foi vendido para um Haras em Pernambuco, para participar de exposições de diversas raças de eqüinos, tendo vencido algumas delas, na modalidade de PSI.
Esse Haras criava algumas raças, mas não o PSI, e ele acabou por se tornar um excelente Reprodutor, e um cavalo de salto (inteiro), chegando a disputar uma importante Prova, na Hípica da Lagoa, onde veio a perder no desempate, ficando em 2º lugar, sua maior vocação nas competições em que veio a participar.
OBSERVAÇÃO: Espero que este Artigo possa incentivar o surgimento de novos Criadores e Proprietários do PSI, cavalo nobre, corajoso, inteligente, veloz, consistente e resistente, que nunca deixou de se empenhar, mesmo nas condições mais adversas, para cumprir com seu objetivo primordial, de proporcionar grandes emoções aos seus Proprietários e Criadores.
Orlando Lima – omlima@infolink.com.br
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