Colunista:
PORQUE ESCREVER? A HISTÓRIA DO FINO TRATO 14/01/2009 - 10h52min
I – INTRODUÇÃO
Neste meu retorno ao RAIA LEVE, resolvi manter o mesmo nome de minha coluna, no período anterior em que escrevi alguns Artigos para este prestigiado site.
Estarei mudando, entretanto, a sistemática adotada naquela ocasião, quando relatava histórias ocorridas comigo e os cavalos que tive, nos 25 anos em que fui proprietário, procurando proporcionar alguns ensinamentos, de ordem prática, que tive oportunidade de vivenciar e aprender, nesse período.
Minha abordagem terá como objetivo primordial, promover uma retrospectiva cronológica sobre o Turfe, em todas as suas dimensões, ressaltando os aspectos que considero mais relevantes para Criadores e Proprietários do Puro Sangue Inglês (PSI).
Um dos aspectos de fundamental importância para que haja um perfeito entendimento dos conceitos que envolvem o Turfe, e todas as suas atividades, consiste no fato de que todos os participantes devem ter o mesmo entendimento sobre as expressões usadas no Turfe, portanto, falando a mesma linguagem e tendo o mesmo conhecimento sobre seus respectivos conceitos, para facilitar o entendimento entre os diversos participantes desta importante Atividade Econômica.
Ao final do ano de 2008, completei 18 meses da Consultoria do PSI, e pude constatar que ainda é muito forte o espírito do Amadorismo na criação nacional, constituindo–se numa autêntica “barreira cultural”, difícil de ser ultrapassada, predominando o casuísmo, não considerando os benefícios que um Planejamento Genético poderia proporcionar para a sua criação.
Para os Clientes que confiaram na Consultoria do PSI, a primeira Etapa está concluída, devendo prosseguir, agregando novos Serviços, aperfeiçoando os atuais Serviços e, sobretudo, objetivando a INTERAÇÃO com os Leitores que, efetivamente, venham a se interessar pelos temas abordados em meus Artigos, visando, em geral, a gradativa elevação da qualidade média da criação do PSI no Brasil, para os que venham a adotar o Planejamento Genético como o meio mais adequado para qualificar sua respectiva criação, assim como, para facilitar o caminho daqueles que pretendam vivenciar as emoções que apenas a propriedade de um PSI pode proporcionar.
É preciso que haja uma UNIÃO de pensamento e realizações, em prol de nossa criação, com a participação de todos os Atores, em todos os Segmentos do Turfe no Brasil, para que possamos alcançar o lugar merecido, conquistado e reconhecido, no âmbito da criação internacional, abrindo um Mercado consistente e constante, a nível nacional e internacional, que conceda o devido valor a Produtos de qualidade, que somos capazes de produzir.
Para tanto, é preciso que esses Atores, encarem o Turfe como uma autêntica ATIVIDADE ECONÔMICA, e olhem para os seus custos, não como DESPESAS, e sim, como INVESTIMENTOS, capazes de possibilitar retorno, não só como entretenimento mas, também, sob o aspecto econômico–financeiro.
Concluída esta Introdução, como não poderia deixar de ser, referendando a minha homenagem a este cavalo tão importante para mim, dentre os 180 cavalos dos quais fui Proprietário nestes 25 anos, passo a contar a minha história com o FINO TRATO.
II – A HISTÓRIA DE FINO TRATO
PARTE I
Dentre os 180 cavalos que tive, no período entre 1972 e 1997, ainda que não tenha sido o de melhor qualificação nas pistas, foi o que mostrou mais Valentia, Consistência, Resistência, “Soundness” (Saúde) e, acima de tudo, AMIZADE.
Correu dos 2 aos 8 anos, exatas 100 vezes, alcançando 8 vitórias, 23 2ºs lugares (o que parece ser recorde na Gávea) e mais 56 colocações, entre 3º e 5º lugares, em sua grande maioria, conquistadas no Hipódromo da Gávea.
Tudo começou em 1974, por ocasião da liquidação do Haras Vargem Grande, onde adquiri uma Matriz, IBY, negra, esbelta, porte médio, com andar de felino, criação do Haras Mondesir, filha de WILDERER X CASULA por SWALLOW TAIL X MASAKA por KING SALMON.
Nessa época, me encontrava nos primórdios de meus estudos e pesquisas sobre o PSI, mas já tinha minhas convicções e preferências, em relação a notáveis Reprodutores do século 20, e IBY preenchia dois requisitos muito importantes para mim:
1º – Seu Pai, WILDERER, vencedor do Derby alemão, apoiava uma observação minha sobre a excelência dos Reprodutores alemães, na função de Avô Materno;
2º – Seu 3º Avô Materno era KING SALMON, um neto paterno do fenômeno THE TETRARCH, em meu julgamento, o melhor Reprodutor do século 20.
Era tudo o que os meus, ainda, incipientes conhecimentos, desejavam!
IBY estava prenhe ao chegar ao Haras de Pierre Vaz, no Paraná, um dos melhores Jóqueis do Turfe brasileiro, em todos os tempos, mas acabou abortando, e coloquei em prática minha principal convicção, ou seja, servi–la por um Reprodutor descendente de HYPERION, por seu Alinhamento Paterno (“high line” do pedigree).
HYPERION foi o personagem do primeiro Artigo que escrevi sobre PSI, para a antiga Revista JCB, à sua época, da maior importância para o Turfe brasileiro.
O Reprodutor do Pierre Vaz era MINDIENNE, cavalo de Porte Médio, castanho escuro, quase negro, filho do excelente Reprodutor PEWTER PLATTER, um filho de OWEN TUDOR (Pai do excepcional TUDOR MINSTREL), por HYPERION.
O meu “Planejamento Genético” estava montado, e três fortes convicções minhas, plenamente atendidas!
Um grande Amigo do Rio Grande do Sul, um dos expoentes da transmissão das Corridas de Cavalos, no Brasil, o notável locutor, Vergara Marques, dispunha de 4 vagas no Posto de Monta do Cristal e, para lá, enviei minhas 4 Matrizes, inclusive, a IBY.
Em outubro de 1976, exatamente, no dia 4 de outubro de 1976 (dia seguinte em que completei 7 anos de casado), estava em viagem de serviço pelo BNH, em Porto Alegre, quando Vergara me comunicou que acabara de nascer um potrinho negro, que pude visitar, no sábado, quando estava com 4 dias de vida.
Parecia um calunga, esperto e arisco, escondendo–se atrás da Mãe, que me olhava com “cara de poucos amigos”, sempre que tentava me aproximar dele.
Mais uma coincidência ocorreu nessa semana de outubro, pois naquele sábado à tarde, o cavalo LINDO GAROTO, que eu tinha em sociedade com Vergara Marques, vencia uma bonita carreira, no Cristal, tendo eu o privilégio de tirar uma foto com meu Amigo Vergara Marques.
Do Hipódromo, fui direto para o aeroporto, retornando ao Rio de Janeiro, após uma memorável semana, com auspiciosos resultados como Profissional, e como Criador e Proprietário de PSI.
Após exaustivas pesquisas, enviei para o Vergara, três nomes muito “sonoros” e pomposos mas, no final das contas, prevaleceu a intuição do Vergara que colocou o nome de FINO TRATO.
Fiquei uma “fera” com o Vergara! Aquilo era nome que se desse a um cavalo de corrida? Tentei mudar o nome, mas era complicado e caro! Até que fui alertado por um amigo turfista, sobre nomes “exóticos” que resultaram em ótimos cavalos, como ZUM ZUM ZUM, QUIPROQUÓ e GRÃO DE BICO, e acabei me conformando.
Sábia decisão! FINO TRATO tornou–se um dos mais populares cavalos do Hipódromo da Gávea, à sua época!
Um mês após seu nascimento, vendi minhas Matrizes, inclusive a IBY, com a condição do Haras que a comprou criasse o potro para mim. O que foi cumprido!
Na viagem de Porto Alegre para São Paulo, onde ficava o Haras que a comprou, a carreta que levava a IBY, prenhe, e com o FINO TRATO ao pé, sofreu um grave acidente, por sorte, nas proximidades do Jockey Club de São Paulo, mas no qual morreram alguns animais. Milagrosamente, IBY, que ficou por 45 dias no Hospital do JCSP, apesar de seriamente ferida, não abortou, e o FINO TRATO não sofreu um arranhão sequer. Era um animal predestinado para uma bela campanha!
Foi criado de forma rústica, sem maiores cuidados e apoio, pois não era de criação do Haras que comprou a IBY.
Ao chegar para mim, no Hipódromo da Gávea, estava feio, peludo, magro, apático!
Um ex Treinador, amigo nosso, ao vê–lo, exclamou: “Dr., o Sr. Pode entender muito de cavalo, mas esse aí não vai chegar correr!”
Foi para um Treinador, conhecido como especialista na iniciação de potros, que conseguiu melhorar um pouco o seu aspecto, estreando com 2 anos, precipitadamente mas, para surpresa geral, num páreo com 17 potros, em 1 000 m, pista de grama, entrando na reta final em último, acabou por chegar em 3º, agarrado com dois “penqueiros” comprovados. Mais 50 metros, teria vencido!
Ficamos, totalmente, surpresos com aquela atuação, sendo o franco favorito na corrida seguinte. Durante a semana da corrida, pisou numa pedra, que danificou, seriamente, seu casco dianteiro direito, fator este, que veio prejudicar, expressivamente, sua futura campanha nas pistas.
Como me encontrava em São Paulo a serviço, não pude evitar que corresse e, como não poderia deixar de ser, foi último no sábado e, na 2ª feira seguinte, já estava na cocheira de um novo Treinador.
Há um ditado muito expressivo para mim: “Há males que vêm para o bem!”
Foi exatamente o que aconteceu, pois este Treinador viria ser um grande AMIGO, um autêntico irmão mais velho! Seu nome: EDIO POLO COUTINHO, o festejado “Capitão”!
Com a experiência e conhecimentos do Capitão e com o grande conhecimento que eu tinha sobre medicamentos, traçamos um programa para a recuperação daquele potrinho raquítico, desanimado e, seriamente, ferido em um de seus cascos, pesando cerca de 418 kg, feio e desajeitado.
O Capitão teve que desbastar, praticamente, 2/3 do casco, mandou fazer uma ferradura especial, fechada atrás, para que ele pudesse galopar, de forma suave mas, com o passar do tempo,galopava em distâncias, progressivamente, mais longas, chegando a galopar, diariamente, cerca de 3 600 m, na pista do Hipódromo da Gávea.
Paralelamente, durante os três meses desse período de galopes, que convencionei chamar de CONDICIONAMENTO, antes do TREINAMENTO de pista, propriamente dito, começamos a dar para ele, medicamentos à base de um Complexo combinado de Aminoácidos, Vitaminas e Sais Minerais, um composto das Vitaminas ADE, e um composto de Cálcio e Fósforo, na proporção molecular de 2 de Ca para 1 de Ph.
Resultado! Ao final de 75 dias, estávamos diante de um potro de Porte Médio para Pequeno, com bela Massa Muscular, com Olhar vivo e atento e, acreditem, pesando 460 kg. Estava pronto para enfrentar o Treinamento para a sua reestréia.
Depois da longa ausência, do tratamento, condicionamento e treinamento intensivos, voltou numa Prova na pista de areia, que não era a sua preferida, mas que seria a mais conveniente, em razão do problema no seu casco, logrando um promissor 6º lugar.
A próxima corrida, ocorreu no dia do GP Brasil de 1979, já com 3 anos, conduzido pelo Juvenal, exatamente, no páreo seguinte ao GP, vencido pelo APORÉ, conduzido pelo Juvenal que acabara de vencer o seu primeiro GP Brasil.
Muita emoção, Juvenal aos prantos, fiquei muito preocupado com as suas condições emocionais, mas afinal, Juvenal entrou para o cânter com o FINO TRATO, muito tempo após os outros competidores, recebendo a merecida ovação.
Ganhou muito fácil, numa Prova em 1.200 m, na pista de grama!
Seu peso, em corrida, fixou–se nos 450 kg, o qual mantinha com incrível precisão mas, por conta do problema no casco, de 10 em 10 corridas, tinha que dar uma parada para o seu recondicionamento, o que veio a prejudicar, sensivelmente, a sua campanha nas pistas, sobretudo, obrigando que viesse a correr na pista de areia, que não era a pista de sua preferência.
Com 4 anos e duas vitórias, se despediu da pista de grama, naquela que, tanto eu, como o Capitão, concordamos ter sido a melhor apresentação de toda a sua campanha.
Foi uma Prova em 1.500 m, pista de grama, com 15 competidores de boa categoria e, embora não tenha vencido, foi, sem dúvida, o nome de destaque, por sua excelente exibição! FINO TRATO gostava de correr comandando o “pace” da corrida e, durante os 800 m iniciais, teve que suportar a carga de um competidor, ao qual dava 11 kg de vantagem, e que chegou em último, andando! Da 2ª metade da grande curva, até o início da reta de chegada, suportou a carga de um dos favoritos do páreo! Nos primeiros 200 metros da reta, aparou, com facilidade, a pesada carga do grande favorito, chegando a livrar 2 corpos, sem que fosse exigido pelo Jair Malta, quando, do fundo do lote, Goncinha trouxe seu ROCK RIDGE, que vinha de colocação em Prova de Grupo, numa atropelada avassaladora, passando de passagem, livrando uns 3 corpos, por fora do FINO TRATO que, numa reação incrível, voltou, junto à cerca interna, vindo a perder por meio corpo, ficando a 2/5 de segundo do recorde, que pertencia, por um longo período, ao excelente “miler” DOMINÓ!
O restante de sua campanha foi desenvolvido na pista de areia, devido ao problema no casco, com destaque para uma corrida em 1 600 m, pela variante, portanto, com duas curvas, realizado logo após ter desabado um temporal, que deixou a areia encharcada, mais dura, como ele gostava, deixando a 8 corpos um cavalo com colocações clássicas, sem ter sido exigido pelo J. Malta, marcando a excelente e inusitada marca, para a época, de 99’3/5”, quando os melhores milheiros, na pista de areia, mal conseguiam marcar 100’ segundos cravados.
Orlando Lima – omlima@infolink.com.br
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